Na edição de janeiro de O Vidroplano, apresentamos os conceitos da World Class Manufacturing (WCM), uma metodologia de referência mundial que envolve técnicas de gestão com o objetivo de alcançar altos padrões de desempenho e eficiência na produção industrial. Este mês, voltamos ao tema para mergulhar nos detalhes das ferramentas mais populares dentro do escopo da WCM – algumas já conhecidas pelas beneficiadoras e demais empresas da cadeia vidreira. Além disso, o instrutor técnico Cláudio Lúcio da Silva, responsável pelas aulas da Especialização Técnica Abravidro, revela o que as empresas precisam fazer para estarem preparadas para aplicar esses conceitos.
As principais ferramentas
Como visto na matéria do mês passado, a WCM engloba várias ferramentas de gestão. Por isso, focamos naquelas mais tradicionais, que podem trazer resultados mais rapidamente à sua produção. O conteúdo a seguir foi baseado em materiais do Sebrae, Senai e da empresa de tecnologia Totvs.
ANÁLISE SWOT
Um clássico da administração, tem o papel de incentivar o empreendedor a analisar sua empresa sob diversas perspectivas. A sigla representa os termos em inglês strengths (pontos fortes), weaknesses (pontos fracos), opportunities (oportunidades) e threats (ameaças). Ao analisar cada um desses tópicos, a empresa terá um diagnóstico da situação em que se encontra, sendo possível criar um plano de ação para validar tomadas de decisão. Dessa forma, conseguirá aproveitar as possibilidades existentes no mercado e, ao mesmo tempo, correr menos riscos.
O que representa cada tópico da SWOT:
- Pontos fortes: empreendedores tendem a ser otimistas por natureza. Por isso, valide as coisas boas da empresa com pessoas que conhecem bem você e o seu negócio. Exemplos de pontos fortes: ter a patente de um produto ou acesso a um bom canal de distribuição;
- Pontos fracos: é importante reconhecer que sua empresa não faz bem tudo aquilo que poderia fazer ou que poderia fazer muito melhor. O foco deve estar em “oportunidades de melhoria”, incluindo o que faz o negócio perder vendas ou aumentar custos;
- Oportunidades: oportunidades podem existir em vários lugares, mas tenha uma estratégica clara, com objetivos bem definidos. Do contrário, a empresa pode estar focando em metas irreais para seu porte ou atuação;
- Ameaças: aponte problemas que o seu negócio pode enfrentar com a concorrência, incluindo quais atitudes os concorrentes poderiam tomar para reduzir suas vendas ou aumentar seus custos.
LEAN MANUFACTURING
Filosofia de gestão focada na entrega de máximo valor com a menor quantidade de recursos. Conceitos como minimização do desperdício e melhoria contínua estão no centro dessa ferramenta, juntamente com esforços para uma maior organização no local de trabalho, adequação dos recursos à demanda e redução do tempo do processo produtivo.
O Lean Manufacturing atua para a diminuição de diversos tipos de desperdícios, incluindo:
- Transporte e logística: deslocamentos desnecessários, de materiais ou mesmo de colaboradores, interna ou externamente, geram gastos de tempo e recursos, afetando a eficiência dos processos. Reflita se vale a pena uma alteração no layout do estoque, chão de fábrica ou centro de distribuição. A organização desse layout, assim como a localização dos maquinários e do inventário, deve ser pensada de forma lógica, para atender as necessidades da produção;
- Superprodução: a produção deve ser a ideal para suprir a demanda dos clientes. Inflar o estoque pode ser arriscado, especialmente em mercados nos quais os produtos possuem baixa rotatividade ou dependem da sazonalidade;
- Tempo de espera: um processo deve se iniciar somente após o anterior ter sido concluído. Materiais, equipamentos, informações e pessoas limitadas às etapas anteriores geram atraso;
- Estoque/inventário: matéria-prima acumulada em exagero pode levar à perda não só do insumo em si como também de dinheiro.
TOTAL PRODUCTIVE MAINTENANCE (TPM)
Também chamada de Manutenção Produtiva Total, tem como foco o crescimento da produtividade por meio da otimização da eficiência dos processos – ou seja, por meio da padronização das operações, o que evitará imprevistos no dia a dia.
Alguns pilares da TPM:
- Manutenção autônoma: os próprios operadores monitoram as condições de seus equipamentos e dos processos à sua volta;
- Manutenção preventiva: cada setor coloca em prática as ações necessárias para o cuidado com equipamentos, ferramentas e máquinas. Com isso, evita-se a interrupção das atividades;
- Manutenção planejada: os responsáveis por cada processo fazem um acompanhamento do desempenho da equipe e dos equipamentos, indicando pausas no cronograma para implementar melhorias;
- Coleta de informações: gestores de área devem levantar dados para serem analisados. A partir disso, é possível priorizar as melhorias mais urgentes. Isso permite também um melhor fluxo de dados entre as diversas seções da empresa;
- Capacitação e treinamento: para implementar a melhora dos processos, é necessário que os colaboradores dominem as tecnologias envolvidas – daí a importância de sempre atualizar os colaboradores;
- Segurança e saúde do trabalho: é a sustentação dos demais pilares, pois garante as melhores práticas em cada atividade.
METODOLOGIA 5S
Conjunto de práticas que auxilia na manutenção de um ambiente organizado, é baseado em cinco princípios. Os termos que definem esses princípios estão em japonês e começam com som de S – por isso o nome 5S.
- Seiri: organização
Tem como objetivo identificar e remover itens desnecessários do ambiente de trabalho; - Seiton: ordem
Cada item necessário para a produção deve ter seu lugar designado, de fácil acesso, minimizando o tempo perdido ao procurá-lo, aumentando assim a eficiência operacional; - Seiso: limpeza
Vai além da higiene do local de trabalho: faz referência a manter um ambiente que promova o bem-estar e a eficiência; - Seiketsu: padronização
Refere-se à padronização dos processos e procedimentos para manter a organização, ordem e limpeza. É sobre criar padrões que toda a empresa possa entender e seguir; - Shitsuke: disciplina
Chave para sustentar as práticas estabelecidas pelos outros S. Representa o compromisso com a melhoria contínua.
OCAP
A sigla vem do inglês Out of Control Action Plan (plano de ação fora de controle). Essa ferramenta serve para facilitar a identificação das anomalias crônicas de um processo, mostrando onde atuar para melhorá-lo. Pode ser aplicada por meio de um fluxograma ou descrição textual da sequência de atividades a serem realizadas após um evento crítico – ou seja, deve mostrar os passos para a solução de um problema e também para a manutenção desses resultados depois disso. Vale reforçar que esse documento é algo vivo: precisa ser atualizado ao longo do tempo na medida em que se adquire mais conhecimento e compreensão dos processos.
Com isso, as causas de interrupções desses processos poderão ser removidas o mais rápido possível, tornando as linhas de produção mais confiáveis e otimizadas. Além disso, a ferramenta estabelece também as responsabilidades pelo gerenciamento dos processos.
CICLO PDCA
É um método de gerenciamento com foco no direcionamento das ações. A sigla também vem de termos em inglês:
- Plan (planejar): o planejamento começa pela análise dos processos. Para isso, é preciso levantar dados, entender o fluxo do processo, identificar os itens de controle e estabelecer os objetivos a serem atingidos;
- Do (fazer): nessa fase, coloca-se em prática o resultado da análise feita anteriormente – ou seja, os novos procedimentos padrões para cada uma das atividades. Ao mesmo tempo, deve-se habilitar as pessoas envolvidas a executar tais procedimentos com eficácia;
- Check (checar): verificar se os procedimentos foram claramente entendidos, se estão sendo corretamente executados. Esse tipo de verificação deve ser contínua, seja por simples observação ou mesmo pelo monitoramento dos índices de qualidade e produtividade via auditoria interna;
- Act (agir): caso seja encontrada alguma anormalidade durante a checagem dos processos, chegou a hora de agir corretivamente, atacando as causas que impediram que os novos procedimentos fossem executados conforme planejado. Essas contramedidas deverão ser adotadas pela empresa como novos padrões, caso seja necessário.
KAIZEN
Essa filosofia busca a melhoria contínua dos processos por meio da ideia de que mudanças pequenas, positivas e perpétuas podem trazer benefícios significativos para as empresas – na prática, pode ser utilizado com sucesso também na esfera pessoal.
Os princípios do Kaizen envolvem:
- Conhecer o cliente;
- Deixar os processos fluírem, mirando sempre o desperdício zero;
- Entender o local de produção da sua empresa, andar por ela, compreender seu layout, dificuldades e desafios;
- Ser transparente e utilizar dados para que as ações de melhoria implantadas se transformem efetivamente em resultados tangíveis;
- Organizar e treinar seu time.
Os benefícios vistos na prática
Melhor do que a teoria, só a prática: algumas empresas de variados elos da cadeia vidreira opinam sobre a importância da gestão com o apoio de ferramentas como as mencionadas nesta reportagem.
“Vemos a aplicação dessas ferramentas como essenciais para garantir eficiência operacional, qualidade dos produtos, cumprimento de prazos e melhoria contínua, fortalecendo sua competitividade e confiabilidade no mercado. E, ao adotar práticas de gestão, a GlassecViracon demonstra um compromisso com a excelência operacional e a melhoria contínua. Entre as principais para nossa produção, estão a TPM, para maximizar a eficiência dos equipamentos, reduzindo paradas não planejadas e garantindo que as máquinas operem com o máximo de produtividade e confiabilidade; o Kaizen, para envolver todos os colaboradores na busca por pequenas e grandes melhorias incrementais que, ao longo do tempo, resultam em ganhos significativos de eficiência e qualidade; e até o MDI (Manufacturing Daily Improvements), para monitorar diariamente os indicadores de desempenho, identificar problemas rapidamente através de análise de Pareto e implementar ações corretivas imediatas sempre com foco em PDCA.”
Renato Santana (GlassecViracon)
“Por meio de um sistema de gestão integrada adquirido por volta de 2010, conseguimos separar os setores, com a possibilidade de gerir cada um deles de forma organizada e com precisão de informações. Foi possível organizar nossos estoques (almoxarifado de entrada e produtos acabados), ganhando agilidade, agilizando inventário e até reduzindo efetivo de mão de obra. Além disso, passamos a administrar melhor nosso sistema de qualidade e gestão ISO 9001, com a melhora na gestão de custos por meio do controle de perdas em processos e retrabalhos. Enfim, conseguimos gerir melhor nosso negócio, enxergar problemas, buscar soluções com mais rapidez, resultando em melhor eficiência no geral.”
José Pedro Ruiz (Diamanfer)
“A implementação dessas ferramentas pode ser desafiadora, mas não impossível. A facilidade de implementação varia dependendo de vários fatores, incluindo a cultura, os valores da empresa, o comprometimento da liderança, o nível de treinamento dos funcionários e a complexidade dos processos existentes. As empresas com uma cultura que valoriza a melhoria contínua e a colaboração tendem a ter mais sucesso nessa tarefa: se a organização já possui uma mentalidade voltada para a inovação, a utilização será mais fluida. Um planejamento gradual com feedback contínuo, junto à formação das equipes e definição de metas claras, permite celebrar muitos resultados. A mudança cultural de uma empresa é sempre o mais complicado – porém, sempre digo que o desafio maior é se conscientizar que é preciso mudar, antes que seja tarde. Os esforços nessa direção serão sempre recompensadores.”
Moreno Magon (Latamglass e MM4Glass)

Como estruturar a empresa
Em conjunto com as ferramentas citadas, os gestores de uma processadora precisam estruturá-la para que as mudanças a serem implementadas se tornem algo concreto. Claudio Lúcio comenta que existem três passos a serem seguidos:
1. O que fazer
É o planejamento estratégico da empresa, no qual serão definidos:
- Missão
- Visão
- Valores
- KPIs (Key Performance Indicator, ou indicador chave de performance, são valores quantitativos que medem os processos internos, como receita, lucro líquido, valor médio do produto etc.)
- Plano de ações
2. Quanto fazer
É a análise de portfólio, que definirá tópicos da atuação comercial, como:
- Mix de vendas
- Budget (orçamento)
- Forecast (revisão e ajuste do orçamento)
Nesse momento, também são estabelecidos os cinco pilares do empreendimento:
- Inteligência assertiva na gestão da entrega de valor ao cliente (PPCPE)
- Inteligência assertiva na gestão de RH
- Inteligência assertiva na gestão das finanças
- Inteligência assertiva na modelagem e gestão de todos os processos da empresa
- Inteligência assertiva em pesquisa, desenvolvimento e inovação (P&D+I)
3. Como fazer
É o cálculo para o planejamento agregado de produção, que mede pontos específicos dos processos industriais:
- Layout
- Lead time
- Máquinas e equipamentos
- Infraestrutura
- Logísticas
- ERP
- Mão de obra
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